A Perda da Inocência
Quitéria tinha apenas dez anos, mas já conhecia a fome como
uma velha inimiga, sentia o peso da miséria em seus ombros frágeis e carregava
no corpo as marcas da violência que dominava a pequena casa onde vivia. O
sertão nordestino, com seu calor sufocante e sua terra ressequida, parecia
sufocar qualquer esperança. Cada dia era uma batalha pela sobrevivência, um
ciclo interminável de dor e desespero.
Ela sabia o que acontecia com as meninas como ela, aquelas
que a miséria empurrava para as margens das estradas. As "Meninas da
Estrada", como eram conhecidas, vendiam seus corpos por qualquer valor,
tentando, de alguma forma, saciar a fome que as corroía por dentro. Para essas
meninas, a inocência era o preço mais alto a ser pago pela necessidade de
sobreviver. Quitéria não queria esse destino. Ela recusava-se a ser mais uma
alma perdida naquele cenário de desolação.
Com o coração apertado, Quitéria tomou a decisão mais
difícil de sua vida. Na calada da noite, roubou uma bicicleta e pedalou para
longe. Não sabia para onde estava indo, mas sabia exatamente do que estava
fugindo. Cada pedalada a afastava da fome, da violência, do destino cruel que
parecia estar esperando por ela na próxima curva.
O vento batia em seu rosto, misturando-se às lágrimas que
escorriam silenciosamente. A estrada à sua frente era longa e desconhecida, mas
ela não olhava para trás. No fundo de seu coração, Quitéria carregava a
esperança de que, em algum lugar, existisse um futuro diferente para ela, um
futuro onde não precisasse lutar para simplesmente existir. Ela pedalou com a
força de quem luta pela própria vida, fugindo de um passado sombrio em busca de
uma luz, por menor que fosse, no horizonte.
Quitéria sabia que, ao se afastar daquela estrada, estava
deixando para trás mais do que a miséria; estava fugindo do destino que roubava
a inocência das meninas da estrada. Ela sonhava com um futuro em que poderia
ser apenas uma criança, livre do fardo que carregava. E, assim, continuou
pedalando, com a coragem que só uma menina de dez anos, decidida a sobreviver,
poderia ter.
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